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Sala de aula eficaz

À medida que a desigualdade cresce, a evasão escolar também aumenta

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ANA CAROLINA STOBBE
05/01/2023

Existem jovens que têm como sonho distante serem jogadores de futebol. Outros imaginam o futuro como cantores famosos. Para Edson Junior, de 27 anos, essa meta “quase platônica” era concluir o Ensino Médio. Após repetir três vezes a sétima série em uma escola pública na cidade de São Paulo, decidiu abandonar os estudos para se dedicar ao trabalho em uma farmácia – isso quando ele estava no final do Ensino Fundamental. 

Por alguns anos, o jovem pulou de um emprego ao outro. “Eu não tinha formação nenhuma. Então aceitava qualquer oportunidade que me oferecessem. Mas me incomodava muito o fato de não ser respeitado por não ter concluído os estudos. Eu sentia que sofria preconceito por isso”, relembra Edson. 

Estudando em casa de forma autônoma, incentivado por uma psicóloga, ele decidiu realizar o Exame Nacional de Ensino Médio (Enem). À época, o estudante que atingisse uma nota de corte mínima recebia o diploma de conclusão do Ensino Médio. Na primeira tentativa, não conseguiu. Na segunda, além de concluir os estudos, conquistou uma vaga no ensino Superior, por meio do ProUni, para o curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas, área na qual trabalha hoje em dia. 

Leia mais: Professora busca ampliar oportunidade de ensino no Capão Redondo

A situação que Edson vivenciou num passado recente é a mesma pela qual passam hoje pelo menos 2 milhões de brasileiros entre 11 e 19 anos. São jovens que largaram a escola sem terminar a educação básica.

“Temos 14% de evasão ou abandono escolar na sexta série do Ensino Fundamental. No Ensino Médio, isso aumenta: no primeiro ano, 21% abandonam ou reprovam”, disse o novo ministro da Educação, Camilo Santana, segundo a revista Isto é

Dentre as razões apontadas para a evasão escolar, 48% citaram a necessidade de trabalhar como fator decisivo. O levantamento foi encomendado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) ao Ipec e divulgado em setembro de 2022. 

O fator pandemia

Em março, tão logo o estado de pandemia foi decretado, as escolas suspenderam as aulas presenciais e correram para se adaptar, migrando os encontros antes presenciais para o digital. O que para alguns foi apenas um momento atípico, para outros representou um desafio para permanecer estudando. 

Rafael em sua formatura do Ensino Médio/Foto: acervo pessoal

Rafael de Almeida foi um desses jovens. Atualmente com 21 anos, ele estava cursando o último ano do Ensino Médio no Colégio Tiradentes da Brigada Militar, em Passo Fundo (RS), quando tudo começou. Junto com o cancelamento das atividades presenciais, vivenciou dificuldades financeiras em casa. Sem internet e equipamentos para acompanhar a turma, parou de frequentar as aulas. 

Leia mais: Os desafios para a recuperação do aprendizado no pós-pandemia

Os índices de evasão escolar vinham caindo desde 2010. Mas foi só a pandemia chegar que o número de crianças e adolescentes fora da escola recrudesceu. Em 2021, o aumento da evasão foi de 171% quando comparado a 2019, segundo estudo da ONG Todos Pela Educação.   

No caso de Rafael, no entanto, o afastamento foi interrompido pela própria escola. “Eles perceberam que eu não estava comparecendo às aulas e que não tinha acesso a grupos do WhatsApp. Então, vieram até a minha casa para verificar o que estava acontecendo. Quando contei para eles, conseguiram me emprestar um computador do laboratório de informática e pagar um plano de internet para mim”, conta. 

Desigualdade: um desafio para superar

Ainda de acordo com o levantamento do Unicef, é possível perceber um entrelaçamento entre a evasão escolar e a desigualdade social. Afinal, o abandono escolar é quatro vezes maior nas classes D e E (com renda per capita de até R$ 500,00) em comparação às classes A e B (com renda per capita acima de R$ 1.500,00).

André Salata/Foto: PUCRS

É justamente essa relação que auxilia a explicar, também, o aumento da evasão durante a pandemia. De acordo com o boletim Desigualdade nas Metrópoles, realizado por uma parceria entre a PUCRS, o Observatório das Metrópoles e a RedODSAL, a média de rendimento dos 40% mais pobres caiu de R$ 470,00, em 2019, para R$ 396,00, em 2021.  

“A pandemia afetou a renda das famílias de todos os estratos sociais. No entanto, os mais pobres sofreram mais. Eles perderam cerca de um terço da renda de trabalho. É um baque muito forte”, reforçou André Salata, professor do programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUCRS e um dos coordenadores da pesquisa.

Ele diz que os impactos da evasão não são apenas individuais, mas também coletivos. “Esses jovens estão em uma fase de acúmulo de capital humano, eles estão se qualificando. E quanto mais qualificado um profissional é, mais ele vai produzir. Portanto, a contribuição que poderá ser dada à sociedade é menor e nossa capacidade de crescer do ponto de vista econômico também diminui. É o futuro de todos que está sendo prejudicado”, lamenta. 

Leia mais: bell hooks e o incentivo à pedagogia engajada

Como combater a evasão escolar? 

Edson ao lado da família/Foto: acervo pessoal

Embora tenha parado no Ensino Fundamental, Edson Junior diz que sempre gostou de estudar. Teve dificuldades no começo da faculdade, mas se formou sem grandes empecilhos. Em 2021, iniciou uma pós-graduação em Engenharia de Software. No dia a dia profissional, considera estar sempre aprendendo para oferecer as melhores soluções para os clientes.

Portanto, o problema não foi falta de vontade. Foi desmotivação. Ele não enxergava uma perspectiva na escola e não se adequava ao modelo de ensino passivo. 

“Eu gosto de pegar um assunto e destrinchar. Nunca me adaptei à ideia de um ensino rígido, em que o professor entrava em sala de aula e pedia para ler da página X à Y. Também nunca fui ensinado a me organizar nos estudos – e não tinha como ter uma base para isso em casa”, recorda. 

Leia mais: Estudantes dizem que aprendem o mais importante fora da escola

3 caminhos que mitigam a evasão escolar, segundo André Salata

  1. Investimento em programas de distribuição de renda – “É importante, em primeiro lugar, ter ações que diminuam a pobreza e a desigualdade. Muitas vezes, os jovens deixam a escola por problemas financeiros na família, e os programas de distribuição de renda repassam os recursos diretamente para a base da pirâmide social. Exatamente onde esse problema acontece.” 
  2. Olhar atento dos gestores “A evasão é sempre um processo de afastamento do jovem em relação à escola. É importante que, uma vez iniciado esse distanciamento, ele seja identificado e que as instituições ajam para interromper esse percurso. Os estudantes precisam ser acompanhados de perto.”
  3. Tornar a escola mais atrativa “Nem sempre a influência das famílias de origem mais pobre sobre a evasão é evidente. Não necessariamente a causa será uma privação econômica. Você tem muitos jovens que acabam se afastando da escola por não estarem motivados. A escola não consegue atraí-los. São pessoas cujos pais, familiares e pares, muitas vezes, não completaram os estudos.”  

Leia mais: Como derrotar os cinco inimigos do engajamento em sala de aula


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