“Não entender os alunos é a principal causa de afastamento dos professores”
EMANUEL NEVES
19/05/2022
Os reais impactos provocados pela pandemia no ensino só serão devidamente medidos com o distanciamento do tempo. Mas já é possível notar uma série de reflexos provenientes do período mais drástico da crise, que se estendeu pelos anos letivos de 2020 e 2021. Um deles diz respeito à ascensão das competências socioemocionais como parte intrínseca da rotina de sala de aula.
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“O analfabeto do futuro será aquele que não conseguir acompanhar as transformações”, define o psiquiatra Celso Lopes de Souza, fundador do Programa Semente, uma ação voltada para o desenvolvimento socioemocional no setor de educação. Ele foi um dos palestrantes da Bett Brasil 2022, realizada entre os dias 10 e 13 de maio, em São Paulo.
Essa capacidade de acompanhar a velocidade das mudanças depende de uma série de fatores. E as habilidades socioemocionais exercem uma ação transversal nesse processo, atuando como catalisador e suporte para as demais valências.
Uma pesquisa do Instituto Ayrton Senna, citada por Souza, demonstrou que o fortalecimento de competências desse tipo contirbui para a melhoria do desempenho, do relacionamento e da saúde mental dos alunos.
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Em busca de musculatura
O psiquiatra destacou o caráter sutil e ao mesmo tempo extremamente profundo do tema. Identificar e consolidar habilidades socioemocionais é um desafio constante para os professores, seja em relação a si mesmos ou na análise do perfil dos alunos.
Trata-se, entretanto, de uma operação que se desenrola de modo quase inconsciente. Aqui, o elemento principal é a linguagem. “A linguagem tem uma capacidade brutal de documentar a realidade. E isso passa pelos adjetivos e locuções adjetivas que utilizamos para caracterizar as pessoas”, explica Souza.
Ou seja, a conscientização em torno do emprego do discurso é um passo inicial dessa missão. A ideia é utilizar a linguagem não mais de forma automática, mas movida pelo foco da consciência, colaborando para uma construção diária.
O equilíbrio como chave
Outro ponto importante para o entendimento da pauta é a delimitação dos diferentes perfis socioemocionais. Souza utiliza um padrão dividido em cinco pilares: autogestão, abertura ao novo, modulação emocional, engajamento com os outros e amabilidades (veja abaixo).
A tabela acima é como um mapa que auxilia essa identificação. Há, por exemplo, estudantes com grande capacidade de autogestão. São organizados, focados, responsáveis. Mas o seu potencial de inventividade é muito baixo. O inverso também é bastante comum: alunos extremamente criativos, mas incapazes de conduzir ou materializar um projeto.
Já o pilar de engajamento se refere à capacidade de explanar e impor opiniões, dizendo não quando necessário. Num cenário ideal, ele se complementa com a coluna da amabilidade, em que se agrupam traços de empatia. “Por vezes, dizemos a uma pessoa que ela deve deixar de ser tão boazinha. Pelo contrário: essa é a sua força. A empatia é o que vai mudar o mundo. Mas ela deve buscar itens do pilar ao lado para saber se impor. Assim nascem os líderes”, aconselha Souza.
O pilar central, por sua vez, ganha primazia no atual momento de transformações. A modulação do medo é especialmente importante na fase de puberdade e adolescência, quando as mudanças e a necessidade de aceitação podem provocar traumas profundos. Souza relata que o desenvolvimento socioemocional atinge um vale entre os 10 e 15 anos, mesmo em crianças que não haviam demonstrado dificuldades. Isso se deve a essas desafios do pilar central – comuns até mesmo entre os adultos.
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Foco na capacitação
A complexidade do tema exige, acima de tudo, um engajamento das instituições e dos docentes na missão de conduzir um desenvolvimento profícuo das competências socioemocionais. E o único caminho possível é municiar os profissionais com o ferramental necessário para lidar com esse tipo de desafio.
Daí a importância cada vez maior da capacitação de professores e gestores. “Não conseguir entender os alunos é a principal causa de afastamento dos docentes”, concluiu Celso Lopes de Souza.
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